terça-feira, setembro 25, 2007

Distúrbios alimentares afectam um rapaz por 10 raparigas

Os distúrbios alimentares afectam pelo menos um rapaz por cada dez raparigas, revelam estimativas internacionais dos centros de tratamento que alguns especialistas consideram ficar aquém da realidade.
Os especialistas duvidam das estimativas porque muitos rapazes não assumem problemas habitualmente associados ao universo feminino, como a bulimia e a anorexia, disse à agência Lusa Paulo Machado, vice-presidente do Núcleo de Doenças do Comportamento Alimentar (NDCA), a propósito do Congresso Europeu de Distúrbios Alimentares, cujos trabalhos arrancam quinta-feira na Alfandega do Porto.
Uma especialista estrangeira contou mesmo ao investigador português ter recebido uma queixa de um doente sobre o uso exclusivo de formulários cor-de-rosa para as perturbações do foro alimentar.
O autor do último estudo divulgado sobre a prevalência de distúrbios alimentares em Portugal referiu que para realizar uma investigação idêntica no universo masculino seria necessário entrevistar 20.000 rapazes, pelo que não há, quer a nível nacional, quer internacional, estimativas fidedignas quanto a casos existentes na comunidade.
Numa entrevista a cerca de 2.000 raparigas, o investigador registou uma prevalência de três por cento de distúrbios alimentares entre as adolescentes e jovens portuguesas, entre os 12 e os 23 anos, ou seja 25 mil raparigas.
A diferença entre géneros poderá ser explicada por vários factores, como o desenvolvimento mais precoce das raparigas, a sua vivência emocional e afectiva ou pelo simples facto de serem mulheres, segundo Abel Matos Santos, também membro do NDCA.
Nos dois sexos, encontra-se um importante número de distúrbios em jovens que praticam desportos como o judo, as lutas ou as corridas de cavalo, em que o peso é determinante para a definição de escalão de competição ou da vantagem competitiva.
A dança também foi apontada como uma área que pode potenciar o risco de distúrbios.
Mas os dois especialistas contactados pela agência Lusa garantem que não há um único factor que possa explicar os distúrbios.
«Pode dever-se a vulnerabilidades genéticas, factores biológicos ou ambientais. Se soubéssemos a causa exacta, poderíamos combatê-la», lembrou Paulo Machado.
«Não há uma razão, mas há uma constatação de um conjunto de circunstâncias ligados à vulnerabilidade do desenvolvimento e adaptação dos adolescentes à vida adulta», analisou, por seu lado, Abel Santos Matos.
Essa vulnerabilidade também pode explicar outros comportamentos desviantes entre os jovens, como o consumo de substâncias nocivas, adopção de comportamentos marginais, depressão ou tendências suicidas.
Outros jovens sentem-se mal na sua pele e acham que podem resolver todos os problemas com a perda de peso, «mas isso só piora a situação», sublinhou o psicólogo do Hospital de Santa Maria.
Abel Matos Santos também lembrou que por vezes se recorre a explicações baseadas nas imagens dadas pela moda ou pela existência de mães manipuladoras, mas o certo é que há uma multiplicidade de factores.
No entanto, as imagens demasiado perfeccionistas podem ser potenciadores de risco, até porque «às vezes pessoas demasiado magras podem sentir-se gordas com essas imagens», alertou Paulo Machado.
«Toda a gente se preocupa com a forma e muitas pessoas dizem que não se importavam de perder quatro ou cinco quilos, mas não colocam em causa a sua família, carreira ou os jantares fora de casa e as pessoas com distúrbios fazem-no», referiu.
Os distúrbios alimentares estiveram terça-feira em debate no Congresso Ibérico de Distúrbios Alimentares, em Lisboa, e estarão em cima da mesa quinta e sexta-feira na Alfandega do Porto, durante o Congresso Europeu, que tem hoje à tarde a abertura oficial.
Na capital eram esperados entre 150 a 200 participantes, enquanto no Norte deverão estar presentes 170 especialistas europeus e convidados dos Estados Unidos, Canadá e Japão.
Os principais distúrbios alimentares são a anorexia, dietas demasiado rígidas para perder peso e a bulimia, que passa por momentos de consumo de grandes quantidades de alimentos num curto espaço de tempo, seguidos de exagerada actividade física, fortes restrições alimentares, provocação de vómitos ou uso de laxantes.
Também na lista estão as crises de voracidade alimentar, que consistem na ingestão descontrolada de comida e consequente aumento de peso, e a obesidade.
No entanto têm surgido casos atípicos de comportamentos que não cabem nas actuais definições, o que ameaça fazer mudar as classificações das doenças.
Discutem-se definições clínicas onde possam ser incluídos, por exemplo, casos como pessoas que vomitam uma pequena quantidade de comida e continuam com um peso normal, ou seja não chegam ao peso extremo definido para a anorexia.
Os números indicam que nos últimos 20 a 30 anos a anorexia tem estabilizado e os da bulimia a diminuir.
No entanto, em Portugal, Abel Matos Santos considera que as estatísticas estão a aumentar, embora a razão possa ser a existência de mais consultas e não um maior número de doentes.
Diário Digital / Lusa
19-09-2007 9:17:57

Sem comentários: