domingo, janeiro 18, 2009

Ajuda a anoréticos já tem casa própria

Associação com sede ao fim de 15 anos. Apoia 500 pessoas
2009-01-15
INÊS SCHRECK
Há 15 anos que a Associação dos Familiares e Amigos dos Anorécticos e Bulímicos esperava ter casa própria. Tem, a partir desta quinta-feira, em Matosinhos. A abertura da primeira sede permitirá dar outras respostas a quem sofre.
Os pedidos de ajuda caem no telemóvel de Adelaide Braga a qualquer hora. Do outro lado da linha, há sempre alguém, com dúvidas, a pedir um conselho, alguém corroído pela culpa a desabafar, alguém que não consegue lidar com a estranha atitude de um filho perante a alimentação. Adelaide Braga é presidente da Associação dos Familiares e Amigos dos Anorécticos e Bulímicos, a funcionar há 15 anos, agora com sede em Matosinhos.
As chamadas são cada vez mais. "Recebemos, em média, um pedido de ajuda por dia, o que é alarmante", refere a dirigente. Ao todo, são mais de 500 pessoas que, em todo o país, recorrem ao apoio da associação, que hoje comemora um dia especial. É a inauguração das instalações da sede da AFAAB no edifício da Junta de Freguesia de Matosinhos.
Não é mais do que gabinete com uma sala de reuniões para poder receber quem pede ajuda. Não chega para sentar as cerca de 30 pessoas que se juntam todos os meses nas reuniões que decorrem no Hospital de S. João, no Porto. Mas é muito mais do que alguma vez tiveram.
"A sede era em casa de um dos sócios, na Rua da Boavista", explica, lembrando as cartas enviadas à Câmara do Porto e às juntas de freguesia, as amáveis recusas e as que ficaram sem resposta. "Quando falámos com o presidente da Junta de Matosinhos mostrou-se disponível de imediato e, por sorte, tinha este espaço", conta a líder da associação, satisfeita.
Adelaide tem uma filha que sofreu durante oito anos de anorexia nervosa e bulimia e lembra-se do que é estar perante estas doenças e não saber a quem recorrer. Por isso, trabalha, sem receber nada em troca, mas com a certeza de que pode aliviar o drama dos outros com os resultados positivos da sua experiência.
"Os pais culpam-se muito, mas estas doenças só acontecem quando há uma predisposição física e mental para isso", alerta a dirigente. Os sinais são muitos (ler caixa), os efeitos podem ser devastadores, até fatais, mas 70% dos casos de anorexia nervosa e de bulimia nervosa têm cura, quando bem orientados. São doenças que afectam sobretudo as mulheres (90%), que atravessam todas as idades, com especial incidência na adolescência, e transversais a toda a sociedade. Exigem tratamento psiquiátrico, mas é difícil o doente admitir que precisa de ajuda. "No caso da minha filha o mais complicado foi conseguir que parasse de induzir o vómito. Tinha um sentimento de culpa pelo que comia horrível", conta.
"Metem na cabeça que o peso ideal são 20 ou 30 quilos e se engordam 100 gramas é o fim do Mundo! Olham-se ao espelho e vêem pneus onde só há ossos", continua. Nos piores casos, a debilidade é tanta que, por falta de defesas, uma pneumonia pode ser fatal. Foi o caso recente de uma menina de 15 anos, cuja família pediu ajuda tarde de mais, recorda Adelaide. Ou de um jovem de 21 anos, estudante em Coimbra, que morreu por falência dos orgãos, debilitados pela falta de alimentação.
Adelaide não sabe dizer se o número de doentes tem aumentado, o que sabe é que há muitos casos escondidos. "Estima-se que 1% da população seja afectada", nota. Do total de casos, 20% são crónicos, 10% terminam com a morte do doente (dos quais 5% por suicídio).
Ao telefone de Adelaide chegam pedidos de ajuda de todo o país e de todo o tipo de gente. "Já recebi um telefonema dos Açores de uma médica a pedir ajuda para o filho cirurgião; outro de uma mãe, de uma aldeia do interior, para um filho que é padre", nota.

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